Em 15-7-1994, Cristiano Ribeiro, membro da Assembleia Municipal de Paredes, publicou no extinto
Jornal Novas a crónica n.º 9 do Artes e Manhas. Era o tempo das "vacas
gordas", do bloco central da "prosperidade" e da "iniciativa
individual". Era um alerta.
ARTES E MANHAS N.º 9
O grande escritor moçambicano Mia Couto afirmava no seu livro de contos “Vozes Anoitecidas” (Editorial Caminho, 1986) que o que mais doía na miséria era a ignorância das suas vítimas na sua própria situação. Queria ele dizer que a objectividade na percepção do seu viver é para o ser humano uma quase ilusão. O peixe cego do fundo dos oceanos é um ser adaptado ao seu ambiente de completa escuridão, ausente a possibilidade de uma esperança luminosa.
De forma semelhante as sociedades do bem estar e da opulência criam cenários de aparente normalidade, sem contradições nem imponderáveis, uma imagem de oásis de equilíbrio num deserto caótico. Aqui aparentemente somos mais capazes e livres, mas de facto cada vez mais submetidos, condicionados e dependentes. Aparentemente somos donos do nosso destino, agentes de opções e escolhas, na prática abstencionistas, ignorantes, indecisos e manipulados, vítimas do (des)emprego, da doença, do trânsito, da necessidade da promoção social, do marketing e do consumismo. Somos inapelavelmente frágeis e solitários na multidão.
Nas sociedades subdesenvolvidas, o desafio é o da capacidade de assegurar uma subsistência digna e a auto-suficiência alimentar, um equilíbrio dinâmico entre uma natureza por vezes hostil e a necessidade de produzir e inovar. Interessa crescer, aumentar a qualidade de vida, combater o pessimismo e a impotência, (re)organizar a sociedade. Importante é abrir umas frinchas por onde penetrem os raios do progresso.
A nossa sociedade pelo contrário extasia-se com a contínua necessidade de afirmação pessoal e de grupo, elevando a produção e a riqueza ostensiva ao nível de metas ilimitadas. Julgo que uma boa terapêutica seria um esforço de racionalizar a produção, reciclar o desperdício, readaptar os recursos, respeitar a pessoa humana como único e fundamental destinatário do desenvolvimento.
Reescrever o futuro da humanidade passa por homogeneizar estas duas realidades diferentes. Não há solidariedade que não inclua o combate á desigualdade e ao desequilíbrio. Trata-se de uma tarefa gigantesca, desafio á consciência e ás inteligência humana. Ou será que nos reduzimos á realidade das minhocas?
ARTES E MANHAS N.º 9
O grande escritor moçambicano Mia Couto afirmava no seu livro de contos “Vozes Anoitecidas” (Editorial Caminho, 1986) que o que mais doía na miséria era a ignorância das suas vítimas na sua própria situação. Queria ele dizer que a objectividade na percepção do seu viver é para o ser humano uma quase ilusão. O peixe cego do fundo dos oceanos é um ser adaptado ao seu ambiente de completa escuridão, ausente a possibilidade de uma esperança luminosa.
De forma semelhante as sociedades do bem estar e da opulência criam cenários de aparente normalidade, sem contradições nem imponderáveis, uma imagem de oásis de equilíbrio num deserto caótico. Aqui aparentemente somos mais capazes e livres, mas de facto cada vez mais submetidos, condicionados e dependentes. Aparentemente somos donos do nosso destino, agentes de opções e escolhas, na prática abstencionistas, ignorantes, indecisos e manipulados, vítimas do (des)emprego, da doença, do trânsito, da necessidade da promoção social, do marketing e do consumismo. Somos inapelavelmente frágeis e solitários na multidão.
Nas sociedades subdesenvolvidas, o desafio é o da capacidade de assegurar uma subsistência digna e a auto-suficiência alimentar, um equilíbrio dinâmico entre uma natureza por vezes hostil e a necessidade de produzir e inovar. Interessa crescer, aumentar a qualidade de vida, combater o pessimismo e a impotência, (re)organizar a sociedade. Importante é abrir umas frinchas por onde penetrem os raios do progresso.
A nossa sociedade pelo contrário extasia-se com a contínua necessidade de afirmação pessoal e de grupo, elevando a produção e a riqueza ostensiva ao nível de metas ilimitadas. Julgo que uma boa terapêutica seria um esforço de racionalizar a produção, reciclar o desperdício, readaptar os recursos, respeitar a pessoa humana como único e fundamental destinatário do desenvolvimento.
Reescrever o futuro da humanidade passa por homogeneizar estas duas realidades diferentes. Não há solidariedade que não inclua o combate á desigualdade e ao desequilíbrio. Trata-se de uma tarefa gigantesca, desafio á consciência e ás inteligência humana. Ou será que nos reduzimos á realidade das minhocas?
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